sexta-feira, outubro 29

Ah se deus existisse!

Trecho de entrevista à revista Caros Amigos (novembro de 2000)

"Se eu ganhasse a Presidência para fazer o mesmo que o Fernando Henrique Cardoso está fazendo, preferiria que Deus me tirasse a vida antes. Para não passar vergonha.Porque, sabe o que acontece?Tem muita gente que tem o direito de mentir, o direito de enganar. Eu não tenho. Há uma coisa que tenho como sagrada: é não perder o direito de olhar nos olhos de meus companheiros e de dormir com aconsciência tranqüila de que a gente é capaz de cumprir cada palavra que a gente assume.E, quando não as cumprir, ter coragem de discutir por que não cumpriu"(Luiz Inácio Lula da Silva)

quarta-feira, outubro 20

My way

De dia, disfarce através da razão. As luzes, os carros, o trânsito, a correria o assustam. A luz nem sempre ajuda a visão, por vezes ofusca.

De madrugada não dá pra mentir. A escuridão é de uma clareza inigualável, o silêncio revela um grito ensurdecedor.

Numa dessas madrugadas claras como neve, ele só precisava de uma música triste surpreendente. Uma daquelas músicas que o surpreende em um quarto de motel. Não valia uma música triste esperada, tinha que ser uma música triste inesperada, que fizesse doer os músculos e que fizesse jus àquela noite melancólica, fria e clara como neve.

A alegria das músicas da rádio o irritava profundamente. Quem as 4 da manhã buscaria alegria na rádio? Não tinha jeito, não havia música que expressasse o que ele sentia, não naquela noite melancólica, fria e clara como neve. Abriu mão do inesperado, tirou o cd do Sinatra da gaveta e tocou "My Way". Boa escolha, já que percebera que teria que seguir a vida do seu jeito e se necessário fazer a sua própria música triste e inesperada. Dormiu bem.

quarta-feira, outubro 13

Sobre as gaivotas

Às vezes me pergunto se nos levamos a sério demais. Outras vezes me pergunto se não nos levamos nada a sério.

Uma pequena observação sobre essa estranhíssima mania de ficar me perguntando sobre as coisas me fez tirar uma conclusão: Eu, pelo menos, me levo a sério demais, demais no mau sentido, no mau sentido pra mim porque isso tortura. A maquininha não pára, sabe? E nem a mais moderna das máquinas funciona ininterruptamente (afirmação sem nenhuma base de uma pessoa que não se leva tão a sério assim). Essa maquininha aqui precisava de uma pausa pra manuntenção porque esse eterno trabalhar causa sérios danos, alguns curtos circuitos, uns problemas sem explicação como no Windows 98, que aliás é um grande ensinamento de que nem tudo na vida tem explicação. Alguém me disse que alguem disse que ouviu alguém dizer que a gaivota só voa porque não se leva tão a sério. Eu concordo, eu concordo. A confusão do texto é proposital ou inevitável. Proposital para refletir a confusão da maquininha, inevitável pois a mesma não sabe lidar de outra forma com o mundo que a fez complicada assim. Aliás, esse é o mesmo mundo das gaivotas que não se levam tão a sério nem são tão complicadas. Juro que vou tentar tirar algum ensinamento do Windows 98 e não tentar explicar tudo.

sexta-feira, outubro 8

É a maldita possessividade

Valeu pelo texto, Rita, gostei muito. O engraçado é que já tentei escrever sobre isso, mas nunca fui tão feliz quanto o escritor português.

"... E de novo acredito que nada do que é importante se perde verdadeiramente. Apenas nos iludimos, julgando ser donos das coisas, dos instantes e dos outros. Comigo caminham todos os mortos que amei, todos os amigos que se afastaram, todos os dias felizes que se apagaram. Não perdi nada, apenas a ilusão de que tudo podia ser meu para sempre."

Miguel Sousa Tavares (Escritor português, a propósito da perda de sua Mãe, a escritora e poetisa Sophia de Mello-Breyner)

segunda-feira, outubro 4

Um estudo de caso exploratório sobre minhas reminiscências ou uma reflexão sobre os "quereres"

Tenho tanta coisa pra escrever que acabo ficando sem nada, pois falta uma unidade de análise, um objeto bem definido. Aliás, essa é também minha maior dificuldade pra escrever a monografia. Será uma limitação minha? Uma dificuldade de obter foco na vida? De querer abraçar o mundo com as pernas, antecipar um futuro ou retardar um presente? Taí, dificuldade de viver o presente talvez seja uma boa unidade de análise.

Será que é verdade que quem tá fora quer entrar e quem tá dentro quer sair (João das Coves apud dito popular, pág desconhecida)? Essa é a nossa (um estudo científico exige que não usemos a primeira pessoa do singular, por mais que a primeira e única pessoa da pesquisa seja eu mesmo com toda a minha singularidade) hipótese. Sem a necessidade de explanar uma teoria, faremos um estudo de caso único, mesmo porque entender a si mesmo já é uma missão muito árdua, impossibilitando a viabilidade de qualquer tipo de pesquisa com uma amostra mais significativa. Mas também podemos considerar que uma única pessoa traz em si muitas outras que passaram e continuam passando, tornando-a uma amostra relativamente significativa no universo. Gente é gente. Nesse estudo de caso abordaremos a pesquisa-ação-mais-que-integral-e-mais-que-sistêmica, pois o ator envolvido no caso está mais do que comprometido com a participação na pesquisa. Pesquisador e pesquisado confundem-se de uma maneira nunca vista anteriormente.

Primeiramente, trabalhamos com um levantamento histórico, usando como ferramenta única o poderoso Guliver. Dados interessantíssimos foram extraídos, como a vontade de ter aparelho quando muitos dos seus amigos pareciam bonitos com a parafernália nos dentes. Além desse, outros mais esquisitos como vontade-de-ter-óculos e, pasmem, vontade-de-ficar-com-o-rosto-descacado também foram identificados. Algumas outras informações mais sigilosas foram obtidas, mas o respeito e o comprometimento mútuo obtido na pesquisa nos impede de veiculá-las, tendo o entrevistado permitido que disséssemos uma delas: também tinha vontade de ter espinhas, ainda que numa versão light, pois essas representavam a maturidade.

Todos esses dados podem ser confrontados com outros casos, que apesar de não terem sido estudados, fazem parte do conhecimento acumulado do pesquisador e do chamado "senso comum", que representa também o conhecimento acumulado desses que me lêem. Essas experiências mostram que quem usa aparelho e óculos não estão satisfeitos com suas respectivas condições. Podemos dizer a mesma coisa dos quem tem o rosto descascado, que além de reclamarem da aparência, sofrem com a dor causada pelos raios ultravioletas. Os detentores de acne encontram-se na mesma situação destes últimos.

Como já foi falado, não há a pretensão de generalização de uma teoria, mas o diagnóstico desses dados levantados mostra claramente a insatisfação de todos com relação às variáveis abordadas (ter espinha, descascar, usar óculos e aparelho). Outros casos, também não tão bem estudados, podem ser citados apenas com o intuito de gerar uma reflexão ao leitor, como a eterna insatisfação das morenas que querem ser loiras e vice-versa. Isso para não falar das que têm cabelo liso que querem ter o cabelo encaracolado e vice-versa mais uma vez.

Essa primeira parte da pesquisa consistiu apenas no uso da memória para o confrontamento de dados, que por sua vez tem o intuito de gerar uma reflexão sobre os "quereres", deixando o leitor livre para eventuais conclusões. A próxima etapa da pesquisa ainda depende de verbas de tempo que podem ou não ser liberadas pelos organismos responsáveis: o ócio e a insônia.