sexta-feira, setembro 30

Apesar de tudo...

... há o Arpoador,
Lennon e McCartney existiram,
Chico compôs com o Vinícius.

... as quintas feiras estão aí,
assim como as mesas de bar com o Césinha
e o novo, que traz tudo,
apesar de tudo

... somos o que somos,
apesar do que fomos,
já que na verdade sempre somos
um pouco do que fomos.

apesar de tudo,
que não é pouca coisa,
estamos aí...

... sou, quero, amo
....apesar de tudo

sexta-feira, setembro 23

Relatos ancestrais do ano de 2005

O elenco de Kids anda invadindo os lugares que freqüento. A “modernice” anda mais moderna que a modernidade. Dentro dessa modernice, os homens continuam livres, leves e soltos para fazer o que lhes convém. As mulheres continuam sofrendo com os seus desejos e pagando caro com o peso da culpa quando cedem. Alguns preconceitos ancestrais andam sendo vencidos, outros estão virando modernices. Correndo o risco de parecer reacionário, afirmo que o rock está cada vez mais reacionário. Acontece que a revolução aconteceu nos anos 60 e 70 e nada perto disso foi produzido nos anos subseqüentes. Há espasmos interessantes, mas o Jimmy Page continua sendo capa de jornal.

A gente se olha, se toca e se cala, mas continua se desentendendo no instante em que fala (Belchior, 1978). Meus velhos amigos continuam novos. As meninas continuam interessantes, apesar da culpa e da modernice exacerbada, chegando ao extremo nas danças em frente à caixa de som. O visual não é acompanhado de atitude. As atitudes ainda vestem calça boca de sino.

Minha mãe continua fazendo aniversário. Eu continuo o mesmo. Não, não, não. Eu ando mudado. Mudado e mudando. Particípio e gerúndio. Ando pensando em sair de casa para uma outra casa, na qual as dificuldades venham a me facilitar as coisas.

Ando pensando em paz. Ando pensando em rede. O mundo continua rápido. As frases continuam curtas, como os cabelos. E as palavras continuam parcas. Ou será que é o impronunciável que continua extenso?

Continuo. E descontinuo. A vida, a história e a música são feitas de ruptura e continuidade. Sou uma ruptura contínua. Envelheço para o novo.

Continuo amando.

quarta-feira, setembro 21

Boçal do bem

Eu te amo tanto, que não te digo
O quanto te amo tanto.
Porque tanto é tão grande
Quanto o medo de te perder.

Hoje eu não queria ser boçal
Como estou sendo agora,
Mas tampouco queria ser falso.

Não queria querer tanto
Nem queria temer o quanto
Porque nunca se sabe o quanto é seu
E o quanto é meu.

E essa mania idiota de querer saber
Só completa a boçalidade
Que é ainda agravada pela vontade
Necessidade,
Sei lá o que,
De não ser boçal!

Seu boçal!

terça-feira, setembro 20

Água Viva

Sábado de sexta mal dormida. Uma rede úmida. Um ela chamado Clarice. Busco o instante matematicamente com o delta t tendendo a zero. Busco o instante da vida, quando o cantar do passarinho é. Não é uma pausa. Ele é e continua sendo. A vida é feita de instantes. Feita de “É”s. A vida vale a pena quando feita de “É”s bonitos. Essas frases bobas são bobas, mas são partes dos meus “É”s de sábado de sexta mal dormida e me recuso a apagá-las.

“Estava com saudades das novidades do sonho”. No sonho se é e mais nada. E justamente por ser, e apenas ser, me liberto de amarras e me embasbaco muitas vezes ao me deparar com gênios dentro do meu sonho. Gênio por ser, apenas por ser e justamente por ser. É gênio quem é e só se preocupa em ser. Não em ser gênio. Ser apenas. A preocupação de ser gênio não é uma preocupação de ser, e sim de ser gênio.

Ser. Ser (ponto).

“Lembrar-se com saudade é como se despedir de novo”. Prolongamos despedidas quando queremos que nossos “É”s continuem sendo. Queria me despedir das despedidas. Ao invés do sou, vivo no fui. Fui. Quero ir. Quero dizer fui pra ser. Ser. Ser(ponto). Ser um ser. Pra ser um ser, preciso ser. E apenas ser (ponto).

“Violeta diz levezas que não se podem dizer”. É na sutileza que se arrebenta. Prefiro um tapa na cara. A sutileza é uma falsa indiferença. Cruel.

“X – o instante impronunciável”. É impronunciável.

“E eu estava só, sem precisar de ninguém. É difícil porque preciso repartir contigo o que sinto”. Falsa ilusão, humanóides!

A busca para entregar-me aos instantes me faz perder diversos instantes. “Realizo o realizável e o irrealizável eu vivo”. Presença leve. Levíssima. Quero gozá-la.

Vivo. Viva. “Traga-me um copo d´água”. Pode me matar.

(Em aspas, trechos de água viva - Clarice Lispector)

quinta-feira, setembro 15

Caçador de borboletas

Essa coisa de querer captar
O sentimento-mais no instante-tal,
Faz parte de um desespero momentâneo,
De uma ânsia suspirática.

Vem cá, borboleta,
Senta aqui do meu ladinho,
Não é todo dia que vejo um inseto metamorfosiático
Violeta com bolinhas amarelas.

Eu pareço piada de cursinho de inglês!

sábado, setembro 10

Nas lúcidas entrelinhas

Sou um bêbado lúcido
E ofereço o que não tenho
Só pra ter o que não ofereço.
Essa história de dar pra receber
É conto da carochinha.
Eu dou pra dar
E recebo pra receber.
Dou por dar
E recebo por receber.
E por perceber,
Que dou o dável,
Quero receber o recebível

sexta-feira, setembro 9

*-mais

Acordou ensopado. Suor também, mas, sobretudo, uma sopa de sentimentos, palavras, letras, fluidos e pessoas. Sim, uma sopa de pessoas, como se não soubesse distinguir o aipo da cebola. As pessoas estavam misturadas como aipo e cebola e é estranho como não conseguia diferenciar coisas tão distintas. E isso porque ninguém faz idéia da distância entre as pessoas ensopadas - muito maior do que entre o aipo e a cebola. Nessa mistura de sentimentos ficava difícil distinguir o dele. Há algum sentimento em mim que não seja meu? Ficou com essa pergunta na cabeça e, apesar de não tê-la respondido completamente, chegou à conclusão de que alguns sentimentos são mais nossos do que outros e o que ele chamou de sentimento dos outros na verdade não era sentimento, e sim, macaquice. Queria se livrar das macaquices e encontrar os sentimentos-mais pra poder focá-los. Nunca gostou muito da idéia de foco, mas nos últimos tempos acordava ensopado todas as noites e vinha achando que era culpa da falta de foco, apesar de saber que isso era uma grande macaquice. Acordar ensopado todas as noites deixa as pessoas piradas, misturando os conceitos, perdendo a coerência, buscando se livrar das macaquices por meio de macaquices. Valia tudo pra encontrar o sentimento-mais. Há apenas um? Não, não, mas no exato momento em que me relatava a história buscava o sentimento-supra-mais, um pelo qual pudesse canalizar todos os fluidos da manhã ensopada. Meu caro amigo, não há sentimento digno de todos os nossos fluidos, disse-lhe, mas o pobre rapaz febril não conseguia entender que o que rasgava o seu ensopado coração iria furar feito uma flecha o coração de qualquer pessoa para a qual direcionasse tal sentimento com a intensidade que lhe vinha. Se encharcar qualquer pessoa ou sentimento – não sabia ao certo a distinção, assim como do aipo e da cebola – corria o risco de matar tal pessoa ou sentimento afogado. Contrargumentou que afogar o sentimento seria uma boa, mas lembrei dos momentos em que reclamava da falta de sentimento e nesse momento percebi a relevância da indistinção – mesmo sem saber se essa palavra existe – entre o sentimento e a pessoa. Afogar o sentimento é afogar a si mesmo. Ser humano é de querer, dizia um poeta baiano, e de sentir, dizia a ele. Afogar o sentimento é um suicídio lento. Encontrar os sentimentos-mais, meu caro amigo, vai implicar em muitas macaquices, em muitas noites encharcadas, em muitos fluidos desperdiçados. Ele odiava a idéia de desperdício dos fluidos, mas lembrei ao meu impetuoso amigo que se não os desperdiçasse com os sentimentos-menos iria afogar os sentimentos-mais, consequentemente a pessoa-mais e, como já disse, isso é um suicídio lento.

E só isso

Ao exercício de estar realmente só, deve preceder um real querer de estar só. E se tudo que busca é a piedade, esteja certo de que a encontrará. E eu terei pena de você.

terça-feira, setembro 6

Meio inteiro não vale

Se já sei os meios pra não ser meio,
Porque não sou inteiro?

segunda-feira, setembro 5

Minto que nem sinto

O meu tempo é hoje
Eu não vivo no passado
O passado vive em mim

(Paulinho da Viola – trecho do documentário “O meu tempo é hoje”)

domingo, setembro 4

Perdidos e Achados

Por tudo que não tivemos,
Por tudo que não vivemos,
Por tudo que juntos não aprendemos
E também pelos beijos tantos que não demos.

Por todos os filhos que juntos não criamos,
Por todas as músicas que sozinhos escutamos,
Pelas estrofes que em parceria não escrevemos
E por todas as viagens que ficaram no vamos.

Pela casa que não construímos,
Pelas noites em claro que passamos
E pelas loucuras muitas que não passaram de devaneios,

Eu choro.

Mas transformo as minhas lágrimas em lágrimas,
Porque há lágrimas e lágrimas
E é importante diferenciá-las.

Pois quero que as lágrimas transformadas
Me dêem força
Para encontrar todos esses dias
Em alguma esquina da vida.

sexta-feira, setembro 2

E o bigodão sul-africano canta assim:

I was born to love you
With every single beat of my heart
Yes, I was born to take care of you
Every single day of my life

(I was born to love you - Freddie Mercury)

quinta-feira, setembro 1

Desepero em moda

E eu quero que esse canto torto
Feito faca
Corte a carne
de vocês.

(A Palo Seco - Belchior)

O pra sempre nunca acaba

Em dia com a fome...
Não é assim que tem que ser?
Não? Como é então?
Me ensina aí, pô.
Eu só sei assim e de vez em quando a fome dói,
Uma dor que dói,
Diferente dessas que são apenas subterfúgios,
Essa não é fuga não, dondoca.
Muito pelo contrário,
Essa peca pela demasia.

“I´ve got a felling, a felling deep inside,
A felling that I can´t hide”

E que seja apenas Por Enquanto,
Dizem que na volta pra casa
A fome passa
E não há mais necessidade de esconder nada.
Nem o nada.

Quero poder ser nada de vez em quando,
Estúpido,
Burrinho,
Assumir os meus mais íntimos defeitos,
Minhas maiores limitações
E não precisar mais das máscaras
Porque já to com medo de que uma delas grude.

Quero voltar pra casa.