sábado, novembro 18

Palavras-chave

Você é uma lindeza tão linda
e um doce tão doce
que só do mais escondido esconderijo
consigo enxergar
a bela beleza
do seu olhar doce, lindo, escondido e belo.

Eu sou uma imperfeição ambulante,
em busca da perfeição ambulatória,
que nem medicar a minha médica
consigo
diante das minhas doenças doentias.

Extrapolo os limites da individualidade
e só enxergo a minha feliz felicidade
porque já tive minha tristeza extrapolada
pelas cegueiras da reciprocidade
que inventei na criativa mente e pensamentos
que crio a cada segundo de vida vivida.

Também peço-te perdão
pela imperdoável mania de querer
me desculpar pelas culpas presentes
nas ausências do meu ser.

Quando ausente,
sinto-me apenas
esquecendo o que vem do lado de lá,
pedindo pra ficar.

Queria dormir ao seu lado agora.

domingo, novembro 12

Resíduos

E realmente, de tudo fica um pouco.
Sobretudo do que um dia fora tudo.
Do pouco, nada fica.

Caderno de Belezas

É que mesmo com tantos murros e pontapés,
existem abraços tão sinceros,
sorrisos tão doces,
lágrimas tão amorosas,
que me dá uma vontdade de acreditar no mundo.

domingo, outubro 29

Pa!

Estive em Flori,
onde um PM me chamou de guri,
onde andei idealizando pessoas
e percebi,
que apesar das diferenças culturais,
há uma lógica regente:
a lógica dos plurais,
a lógica do amor.

Um homem de bar,
desses que quase não falam,
me mostrou,
em meio a discursos e discussões,
o imensurável amor que o rege
e me arrancou lágrima dos olhos
em um ambiente onde homens não choram.

Com olhos de quem continua aprendendo,
e guarda na profundeza dos olhos lacrimejados
a imagem da filha -
a bela Julia Gabriela -,
o homem simples de bar
externalizou a beleza de ser,
a beleza do amor,
a humanidade que o rege,
contradizendo os sabidos da vida -
normalmente com as calças acima dos umbigos -,
que gostam de teorizar sobre a natureza humana.

A natureza humana, ora pois,
pressupõe naturalidade,
e não pode ser entendida em um mundo artificialmente construído,
em que desejos são "desejosamente" manipulados.

Muita gente morre sem descobrir sua natureza,
achando natural dedicar a vida
a construir a morte,
a alimentar a artificialidade humana.

Dinheiro e poder são criações humanas,
portanto artifícios,
embora tenham se tornado fins,
que arrogantemente do lugar de onde falo,
afirmo que não levam a nenhum sentimento
perto do que tive em Flori.

No caminho,
solucei
e
exorcizei,
ao menos por um instante,
as artificialidades presentes em mim.

Vi um pouco da minha natureza,
embora hoje a artificialize com palavras -
criação humana -
a serem aprovadas.

Andei por Flori,
Chorei por Flori,
Fui, do verbo ser,
em Flori.

terça-feira, outubro 10

Da Lagoa

Se ontem fui, por que não serei amanhã o que ainda sou hoje?

De São Gabriel

Sim, tudo é certo logo que o não seja.
Amar, teimar, verificar, descrer.
Quem me dera um sossego à beira-ser
Como o que à beira-mar o olhar deseja.

(Fernando Pessoa)

sexta-feira, setembro 15

Harmonia dos sentidos

Quando os olhos entravam em sintonia com as glândulas lacrimais, os ouvidos faziam pelos se arrepiarem e subia pelo corpo toda a plenitude do momento, em que celebrava, sobretudo, o presente, Clara pensava: quem me dera agora ter comigo um violão e saber tocá-lo. Apesar das inclinações musicais, a menina nos 20 anos vividos não tivera tempo pra se dedicar ao talento que ainda não sabia que tinha.

Talvez isso permitisse a Clara ir além. Não parando para compor, tocar, escrever, Clara ia além nos seus sentimentos. Não os cortava, sentia apenas. Não havia registro formal de grande parte dos sentimentos de Clara, mas muito deles ficaram nesse quarto que hoje habito. Nem todos imateriais.

Hoje sinto Clara de diversas maneiras, mas tudo começou com rabiscos em uma folha de papel encontrada em um armário embutido da cozinha. Não fazia muito sentido ter sido guardado, parecia algo esquecido junto com louças, que de tão velhas, não pude utilizar.

Há homens grandes pensando no amor,
E isto não é uma questão de estatura,
Hoje chorei ao pensar junto na ternura
De um pequeno grande ator.


De fato eram rabiscos. Ao lado do pequeno texto, coisas sem sentido, provavelmente escritas quando Clara falava ao telefone. Nomes de pessoas de cabeça pra baixo, com desenhos abstratos e números tentando dar uma ordem à bagunça feita.

Esse foi o primeiro contato que tive com a menina que sabia voar, sobretudo quando os sentidos se harmonizavam.

segunda-feira, setembro 11

Instante de Amor

Me ame apenas
no preciso instante
em que me amas.

Nem antes,
nem depois.
O corpo é forte.

Me ame apenas
no imenso instante
em que te amo.
O antes é nada
e o depois é morte.

(Affonso Romano de Sant'Anna)

Desistindo da insistência

Clara, com seus dedos finos, personalidade forte e olhar dissimulado, não conseguia entender a hora de deixar. Tudo parecia desistência e Clara não entendia que continuar, por vezes, era uma desistência. Clara, com seus dedos finos, personalidade forte, olhar dissimulado e persistência poucas vezes desistia. E não entendia que a insistência, por vezes, era uma desistência.

Clara, com seus dedos finos, personalidade forte, olhar dissimulado, persistência e ingenuidade dava murros em ponta de faca. Clara seria capaz de voar pela janela. Clara não seria capaz de se suicidar. A ingenuidade de Clara parecia insana aos insanos realistas. Clara sabia voar, ao contrário dos insanos realistas, parasitas da história.

Sua mãe nunca lhe dissera, mas era a mistura de dois grandes nomes. Clarice com Laura. Clarice e Laura nunca se conheceram, passaram por momentos distintos na vida da mãe de Clara. Ambas sabiam voar, ambas tinham inclinações musicais, ambas sabiam amar. Clara fora muito idealizada, como toda criança. Clara tinha passado, entendia de história, motivo pelo qual não desistia. Clara persistia proque entendia de história.

Olhando para o mato escuro, ouvindo música nova, Clara insistia na desistência. Clara, entretanto, desistia da mediocridade dos parasitas da história. Clara tinha o que aprender sobre o amor. Clara tinha o que ensinar sobre história.

Mesmo com os desencaixes

A vida é a arte do encaixe.

quinta-feira, setembro 7

A janela de Clara

Sentada nessa mesma posição, olhando pra mesma mata, pensando também em andar pelo telhado, procurando o mico que outrora vira e embargando a voz pra pronunciar o nome de quem, há pouco, estivera com ela olhando a mesma mata.

A menina que nessa casa morou, fruto da minha imaginação, também pensava nos que antes dela aqui estiveram, sonhando com um mundo dos que sonham, dos que acreditam que constroem a história, dos que constroem. Sonhos não envelhecem nem morrem.

A menina de cabelo curto desalinhado, de traços fortes, porém delicados, captava os sonhos dos que antes dela estiveram aqui. Sonhos que ficam no ar, que não a deixava esquecer a sua continuidade no mundo, mesmo sabendo que um dia também viraria pó. Clara não se conformava com a estupidez dos que, não entendendo a citada continuidade, destruíam as condições físicas do planeta, que a cada dia se mostravam mais perecíveis.

Clara gostava da mata que olhava pela sua janela, a via como uma faixa de resistência à destruição das condições físicas do planeta. Homens, cada vez mais egoístas e burros, sabendo da sua limitação física na terra e não entendendo a continuidade dos seus sonhos, ameaçavam toda a existência e a afirmação de que os sonhos não morrem. A limitação física do planeta ameaçava a eternidade dos sonhos de Clara e dos que antes dela aqui estiveram, sentados nessa mesma posição, olhando pra mesma mata, pensando também em andar pelo telhado, procurando o mico que outrora viram e embargando a voz pra pronunciar o nome dos que, há pouco, estiveram com eles olhando a mesma mata.

quarta-feira, setembro 6

Fragmentos

Choro não só pelo que foi
Choro não só pelo que dói
Choro não só pelos nossos erros
Choro não só pela música
Choro não só pelo não feito

Choro também pelo que ficou
Choro também pelo que virá
Choro também pelos acertos que tivemos
E por todas as músicas que não consegui te mostrar
Assim como filmes e pedaços de mim.

Dificuldades Manuais

Sempre tive dificuldades em escrever à mão
Com a esquerda nunca
pude executar bem as coisas
que me pedia.
A firmeza da direita nunca tive.
Trêmula se me mostra às vezes.
Com a idade não poderei tomar sequer uma xícara
de café.
Mas posso ainda dar um murro na mesa
ante a atual situação ou sobraçar um montão de rosas.
Bem, neste caso, quem treme
é o coração.

(Affonso Romano de Sant'Anna)

Presente

O que te dar neste dia?

O que te daria eu ontem
quando nem te conhecia?
E amanhã, o que darei
se hoje não te dei
o que devia?

O que te dou é apenas
sombra do que querias
Dou-te prosa, e o desejo
era dar-te poesia.

(Affonso Romano de Sant'Anna)

domingo, agosto 13

Apego

E no exato momento em que a caneta parou no papel, em que as palavras precisaram ser inventadas – e não mais expurgadas, como de costume -, percebeu que havia algo de podre no reino encantado.

“Moça dos olhos lindos (trocou menina por moça),

Preferi as páginas em branco pra poder criar em cima do nada, em cima do novo (de fato, precisavam de algo novo)”.


...
A caneta parou...

Tentou a partir de então se explicar: porque escolheu a página em branco e não um cartão apapagaiado que os namorados costumam dar, porque a escolheu sabendo de todas as complicações que isso causaria (sim, já sabia), porque escrevia essa carta de maneira tão idiota e, finalmente, porque ela não fluía e porque havia vários pontos no papel de caneta parada.

A carta, que nunca fora carta, tinha muitos pontos manchando o papel e não fosse o choro seco que o atormentava neste dia, os pontos de caneta seriam manchados pelas lágrimas, que rolavam internamente e se acumulavam em algum depósito lacrimal. Seria essa a razão das mudanças no seu corpo?

O choro seco é corrosivo

Carta pra ser carta precisa ser entregue, mas choro pra ser choro não precisa ter lágrimas. Chorava pela carta que não era carta. Precisava torná-la carta ou parar de precisar disso. Precisava desaguar, talvez precisasse corroer.

O apego é corrosivo.

Precisava corroê-lo porque não é possível eliminá-lo de uma só vez.

Ápice

Aproveito o auge da minha bipolaridade

segunda-feira, agosto 7

Dias assim

Dias de sim
Dias de não
Dias de quanto
Dias de tão
Dias de muito
Dias de pouco
Dias de graça
Dias sem graças
Dias de dia
Dias de noite
Dias de domingo
Dias de sábado
Dias de luta
Dias de preguiça
Dias de santo
Dias nem tanto
Dias quentes
Dias mornos
Dias de paixão
Dias de desamor
Dias de carinho
Dias de dor
Dias de cão
Dias de ressaca
Dias normais
Dias cansados
Dias demais

Demais, demais,

Porém com a absoluta convicção de estar vivendo os melhores 80 anos da minha vida

sexta-feira, julho 21

Comigo

Se você vier pro que der e vier
(...)
Se você vier até onde a gente chegar
(...)
Se você quiser e vier pro que der e vier comigo
(...)
Eu lhe prometo o sol

(Geraldo Azevedo/Renato Rocha - Dia Branco)

quinta-feira, julho 20

Codinome

E espero que o mais honestos dos sentimentos esteja a flor da pele quando o beija-flor te olhar pela janela. Ontem um pousou por aqui, me olhou de lado e me assustei. Nem sempre estamos preparados para o belo. Praticamente o expulsei.

quarta-feira, julho 19

Ascendente

Adoro manter acesa
a chama que me faz ascender.

sábado, julho 15

Game

Em noites de dia,
Me chame.

Dos falsos amores,
reclame.

Nos sábados quentes,
proclame.

Nos dias de noite,
Me ame.

Ideologia

23,
Dizem que é uma questão de idade
Penso que é uma idade de questões.

quarta-feira, julho 12

Um pouco mais

Quando o meu bem-querer me vir
Estou certa que há de vir atrás
Há de me seguir por todos
Todos, todos, todos os umbrais

E quando o seu bem-querer mentir
Que não vai haver adeus jamais
Há de responder com juras
Juras, juras, juras imorais

E quando o meu bem-querer sentir
Que o amor é coisa tão fugaz
Há de me abraçar com a garra
A garra, a garra, a garra dos mortais

E quando o seu bem-querer pedir
Pra você ficar um pouco mais
Há que me afagar com a calma
A calma, a calma, a calma dos casais

E quando o meu bem-querer ouvir
O meu coração bater demais
Há de me rasgar com a fúria
A fúria, a fúria, a fúria dos animais

E quando o seu bem-querer dormir
Tome conta que ele sonhe em paz
Como alguém que lhe apagasse a luz
Vedasse a porta e abrisse o gás

(Bem querer - Chico dos olhos d'água)

Todas, meninas

segunda-feira, julho 3

Essência

E no louco universo da família -
Em que por vezes reina a hipocrisia -,
Podem ser encontradas
As mais belas manifestações
De carinho, ternura
e Abdicações.

Universo paralelo em que nesse
Mundo vasto
Vasto mundo
Temos a real dimensão
Da importância de sermos,
Ora ofuscada pelo emaranhado
De pessoas e egos.

quinta-feira, junho 29

PS

Um coração quando chora,
Precisa ser ouvido.
Há um tanto de lágrimas
Capazes de mudar o curso das coisas.

Um coração quando arde,
Precisa ser estimulado
Antes que o fogo cesse
E retorne à mediocridade dos dias mornos.

domingo, junho 18

O adeus dos sonhos

Os sonhos iam viajar. Helena ia até a estação do trem. Da plataforma, dizia adeus aos sonhos com um lencinho.
(Livro dos Abraços - Eduardo Galeano)

quarta-feira, maio 17

Post Novo

Hoje eu quero pensar no que nunca senti. Todo sentimento novo me faz pensar no que nunca senti e talvez no que nunca irei sentir.

É uma sensação maravilhosa,
Por mais que ansiosa,
De todas as possibilidades que a vida reserva.

Viajarei de avião pela segunda vez,
E isso me arrepia,
Pois da primeira,
Talvez por sê-la,
Tive uma sensação nova,
Dessas maravilhosas,
Que por mais que ansiosas,
Causam a esperança supracitada.

Percebi, ora bolas,
A minha insignificância,
Perante a imensidão de tudo.

Não ria, menina,
Eu achava que era grande,
Embora seja,
Mas eu achava que era maior,
Maior do que sou, sabe?

Achava que o mundo dependia de mim.
Não ria, poxa,
Eu achava mesmo,
E pior,
Achava que gostava disso.

Gostava não,
Eu gosto dessa sensação de leveza,
De pertencimento,
De poder quebrar o pé,
Sem que haja um colapso,
(Por mais que goste também da falta que causo –
Humanóides egocêntricos)

Hoje eu te quero,
Muito mais do que um dia pude querer ser maior,
Mesmo porque eu só achava que queria.
Queria não.

Te quero com meu coração,
Com meu corpo,
Com minha boca,
Muito mais do que com meu ego,
Por mais que o alimente.

Te quero minha, mesmo que livre,
Te quero linda, mesmo com rugas,
Te quero feliz, mesmo que continue buscando.

Ai, essas pessoas não entendem nada de antônimos!

domingo, maio 14

Big Brother

Parceiro de festas, sonhos
E realidades,

Nos dias virados,
Em que pesaram a fragilidade
E evidenciaram-se minhas imperfeições –
Tão imperfeitamente escondidas -
Pude sentir no teu afago
Um acolhedor carinho humano -
Meu coração, meu nariz e meu pé te agradecem.

Nos dias de festas,
Vejo o esforço dos teus olhos -
Já tão miúdos normalmente -,
De ficarem abertos
Para aproveitarmos juntos,
Até a exaustão do corpo,
A beleza dos nossos dias,
Que sabemos
Finitos.

Nos dias de sonhos,
De vida comunitária,
De emancipação social,
De igualdade de oportunidades,
Procuro a tua aprovação na luta diária,
Mesmo que discorde,
Como um menino que precisa ouvir o irmão mais velho.

Voemos, portanto,
Sem medo de avião.

sábado, maio 6

Entregue

Amigo dos dias difíceis,
Se peço socorro pra ti,
É por que enxergo e sinto
Na beleza dos teus olhos e da tua alma
O conforto que necessito
Pra levar a vida com mais leveza.

Encontrando os meus defeitos nos teus,
Me faço humano,
Me desfaço do pano,
Que por muito desengano,
Me separa dos seres errantes.

Amo-te,
Assim como tuas idéias,
Que por vezes concretizamos
Em cartas sonhadoras e utópicas.

Utopias vividas,
Pois acredito na vivência da imaginação,
Mesmo que momentânea.

Sei, que o todo é feito de partes,
Assim como a vida de momentos,
Motivo pelo qual valorizo
O teu sorriso
E tua alegria revolucionária.

Comparo-os a um grito de liberdade,
Tão intenso e bonito,
Que me faz sentir saudade do presente
Mesmo incerto, tortuoso e errante.

Amo as entregas.

terça-feira, abril 11

Sinto que minto

Claro que sinto
E minto.
Minto que não sinto,
Mas sinto que minto que não sinto,
Portanto sinto.

Já que sinto,
O que faço então?

Se minto, também sinto que minto –
Mentira curta –
Logo percebo e sinto de novo
E sinto dobrado -
O já sentido e a sensação de mentira.

Minto pra mim, mas logo sinto.

O que faço então?

Aceito que sinto?
Mudo o que sinto?
Como mudo o que sinto?

Sinto,
Minto,
Sinto que minto,
Penso que sinto que minto.

Sensação quadruplicada.

Prazer de ter sensação, talvez.
Mas cansado do prazer mórbido.

Não quero mais sentir tudo
Pra não precisar mentir.

Sinto
E penso a verdade,
Meu rosto não nega.

Preciso me olhar de fora, por vezes.

sábado, abril 8

Ambas

Guardo e sugo teus olhos
Pra que nos momentos distantes
Em que tocamos nossas vidas
Possa sentí-las de fato -
A vida e tu.

sexta-feira, março 17

Gelatina

E a vida passa. E a vida passa. E a vida corre.

Por mais que tente pegá-la, agarrá-la, mesmo por um ínfimo momento, não conseguirás. É como uma gelatina pululante, que se esparrama pelos dedos, no difícil momento em que consegues tê-la em mãos. Aliás, não a tens em mãos. Ontem, alisaste a vida, eu sei, e achaste que fosse capaz de segurá-la. Ledo engano, menino inocente. Talvez porque esteja com a noção errada do que seja ter a vida em mãos.

Controlá-la?

Se é isso que pensas, pena de ti. Pois nunca conseguirás e mesmo que conseguisses, terias um insuportável sabor de chatice misturado com a amargura da onipotência, que a vida – essa mesma que não consegues agarrar – te fez ter. Controlá-la significaria perder o prazer – o maior da vida – do imprevisível, que te faz mudar os planos que tanto prezas, mas, que no fundo sabes, insuportáveis.

Agora, ter a vida em mãos pode ser a consciência de que não ela não é controlável e de que é o imprevisível, o não controle, o que mais te causa prazer. A tem em mãos no momento em que não a tem. Sim, sei que parece filosofia barata. Redefinirei.

Saber alguns dos meandros da vida, ou ao menos da tua vida, é a consciência necessária para te livrar das angústias da vulnerabilidade que sentes, pois tal consciência te mostra o quanto gostas desta gelatina pululante, desta incerteza diária, desta vulnerabilidade que tanto te angustia. Não pela angústia, mas pelo prazer da incerteza que te causa. Será que pela angústia também?

E a vida voa. E a vida voa. E se esparrama.

quarta-feira, março 8

Sou

Queria ouvir numa música algo parecido com que sinto. Mesmo que a música diga que não sabe dizer o que sente. Quero saber o que sinto ou compartilhar a ignorância dos sentimentos com alguém.

Algo como “meu coração, não sei porque, bate feliz quando te vê”. Ah, essa música é bacana, pois diz o que sente sem saber o que sente, já que não sabe o porquê.

Quero dizer o que sinto, sem saber exatamente. Por que precisaria saber exatamente? Mania de exatas. O mundo é viciado nas ciências exatas. Na lógica formal.

Quero sentir o contraditório. Matar a razão do filho da professora de matemática com dois sentimentos opostos. Quero amar o odiável e me permitir odiar o amável.

Tudo parece engraçado e ridículo quando exposto aos nossos julgamentos. Fodam-se. Fudamo-nos. Deixemos de ser ridículos e sintamos. As pessoas, as músicas, o vento. Mesmo que repetidas.

Mesmo que nossas. Mesmo que nossas. Mais uma vez, mesmo que nossas. Respeitemos os sentimentos. Mesmo que nossos. As músicas, mesmo que nossas. As pessoas, mesmo que nossas. Ops, ato falho, não possuo ninguém, por mais que queira.

Não me possuo. Não te possuo. Embora possuído seja.

“E lá se vai mais um dia”. Sinto-me possuído pelas melodias melodiosas. Aquelas que batem e ficam. Aquelas que ficam e batem. Batem e fazem bater ainda mais. Tenho um coração que bate, que sente. Tenho um coração. Não quero, necessariamente, com isso, ter mais. Mas é magnífica a sensação de ser. De ser humano. De ter um coração. De ter um coração que bate.

Ando descobrindo que sou. Por vezes “egocentro” as coisas, mas não necessariamente. Sei, nas profundezas da minha consciência que não há de ser só aqui que bate um coração. Felizmente, pois haveria de ser tedioso esse triunfo egocêntrico. Haveria de ser solitário. Não haveria de ser, aliás.

Ando descobrindo que sou. Que serei. E seres também.

terça-feira, fevereiro 28

Média

Caretice mesmo é o desregramento pelo simples medo da caretice. Desregramento que não respeita os limites suportáveis.

Pensamento um tanto medíocre, eu sei, mas prefiro ficar com as sensações que consigo bancar.

Nova sensação de mediocridade. Como se nunca fosse além.

quarta-feira, fevereiro 22

Presságio

Desde então

Presságio

Tão apressado

Que esperou

alisE

Olhos amedrontadores
Ou seriam assustadores?

Nada disso, são doces.
Só tem medo ou susto
Quem não os vê
Com a devida atenção
E não percebe que a força é frágil
Ou está na fragilidade
Dos olhos fortes.

E assim dizia os bobos idos de dezembro de 2005:

E volta a cara de bobo
Que de boba nada tem
Estimulada pela insistência
De viver algo além

Além do que se vê
Com os olhos fracos
E desatentos.

quinta-feira, fevereiro 9

O resto

Meio que estou,
Meio que sou,
Meio que vou,
Meio que cedo,
Meio que tarde,
Meio que noite,
Meio que bobo,
Meio que sério,
Meio que eu,
Meio que procuro,
Não tão despretensiosamente assim,
O resto.

Haverá?

Sim, sim,
Não sei quando,
Mas sei que,
Não sei quanto,
Mas sei se.

Futuro

Mais um daqueles,
Eu mando tudo pro alto
E faço de ti
O meu amor.

quarta-feira, janeiro 25

L(e)amb(r)ança

Sim, eu sei, menina,
Não é só isso,
Tem um tanto daquilo outro,
Mas é isso também
E isso é o que resta a ser feito.

As nossas melhores lembranças
E lambanças
Aparecem vez em quando
Pra desvirtuar as outras tantas em construção.

Não devem ser motivo de culpa,
Muito menos de desvirtuamento ou descontrução,
Pois como sabemos bem,
Toda essa vida nova se baseia e se constrói
A partir das lambanças passadas

Mas não me pergunte o que são as lambanças presentes
Nem o que fazer com elas.

sexta-feira, janeiro 6

Ai, a primeira fresta

Carlos amava Dora que amava Lia que amava Léa que amava Paulo
Que amava Juca que amava Dora que amava

Carlos amava Dora
Que amava Rita que amava Dito que amava Rita que amava Dito que amava Rita que amava
Carlos amava Dora que amava Pedro que amava tanto que amava
a filha que amava Carlos que amava Dora que amava toda a quadrilha

(Flor da Idade - Chico Buarque)