sábado, abril 30

O grande picadeiro - certezas e incertezas

Passada a euforia, veio o medo. Passada a calmaria, veio uma calmaria ainda maior. Isso assustou, claro.

- Que medo é esse, rapaz?
- Não sei, não sei. Talvez seja desculpa pra um abraço ou um consolo.
- Consolo? De quem? Você precisa disso? Um abraço eu te dou, pô.
- Sim, claro. Seu abraço é sempre bom. Mas a gente valoriza pouco o que a gente já tem, né? Desculpa dizer isso, mas talvez precisasse de um abraço que não tenho como certo, entende?
- Tá, vou te dar menos abraços daqui pra frente.
- Você entendeu o que quis dizer, porra!
- Sim, entendi. Mas o tal abraço é de alguém específico?
- Sim, de alguém que não tenha como certo.
- Porra, agora você que tá de palhaçada. Você entendeu a minha pergunta!
- Não sei, não sei, talvez. Me sinto tão idiota.
- Também sinto isso a seu respeito. E que papo era aquele de consolo?
- Porra, pára de me lembrar as merdas que eu digo. Me sinto ainda mais idiota.
- São dessas que você tem vergonha que você precisa lembrar, falar.
- Por quê?
- Escondem algo.
- Pára de se fazer de entendido da vida. Você e suas fórmulas, lógicas, certezas.
- É, mas a gente precisa delas. Dá medo não ter nada como certo.
- Agora é você que tá com medo? Medo das coisas incertas? Largue suas certezas, meu caro.
- Agora eu que estou me sentindo um idiota.
- Também sinto isso a seu respeito nesse momento. Engraçado que me sinto melhor depois da sua insegurança revelada.
- Escroto.
- Eu sei, eu sei. Não conseguimos viver sem nenhuma certeza mesmo, mas os maiores prazeres da vida vêm das coisas incertas, inesperadas. Não é?
- É, eu sei. Mas não dá pra esperar algo inesperado. Isso angustia.
- A falta de certezas?
- A falta de perspectiva.
- A falta de certezas, é a mesma coisa.
- Tá, e daí?
- Agora eu que me farei de entendido da vida e te garanto que você pode esperar por algo inesperado.
- Mas quando?
- Porra, aí você quer muito. O inesperado não pode ter dia certo. Seria esperado.
- Você gosta das coisas incertas, né? O meu abraço, dito “certo” por você, não tem o mesmo valor.
- Deixa de ser melodramático, porra. Aquilo foi uma frase momentânea. Se não tivesse o seu abraço, sentiria muita falta. Como posso sentir falta de algo que tenho, porra!
- Você precisa sentir falta das coisas?
- É, parece que sim. Que idiota que sou, mas o que posso fazer?
- Ria, ria de si mesmo. Ria de mim mesmo. Isso aqui é um grande circo mesmo.
- Boa, sinto você menos idiota agora. Me dê um abraço.
- Mané!

Nenhum comentário: